Capital deverá ter reforço de PMs do Interior

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16121678PROTESTOS PELO PAÍS

A Copa começou nas ruas e nos gabinetes 

Para o governo federal, será inevitável a deflagração de uma nova onda de manifestações pelo Brasil durante o Mundial. A fim de evitar que atos de violência manchem a imagem do país e garantir a segurança da multidão de estrangeiros prevista para desembarcar nos aeroportos das 12 cidades-sede em junho, o Planalto monta estratégias para amortecer o impacto das mobilizações populares, ao mesmo tempo em que tenta abrir o diálogo com os grupos descontentes com os gastos previstos para a Copa. Até mesmo um gabinete de crise informal já foi criado para monitorar as movimentações.

Enquanto se empenha em realizar a “copa das copas”, como a presidente Dilma Rousseff prometeu em sua conta no Twitter, o governo federal é assombrado pelo slogan “não vai ter copa”, espalhado por militantes nas redes sociais. A possibilidade de que o Mundial seja manchado pela eclosão de protestos generalizados e violentos virou o grande temor do Planalto, que se mobiliza para fazer frente à ameaça.

Sinais do que pode vir pela frente não faltam. No sábado, a área central de São Paulo foi convulsionada por um protesto que tinha como alvo específico a realização do Mundial promovido pela Fifa. O saldo foi de quebra-quebra, 135 detidos e um jovem baleado pela polícia.

Informada sobre o protesto durante uma escala em Lisboa, Dilma convocou uma reunião para hoje, logo depois de sua chegada de Cuba, para tratar da estratégia do governo. Foram chamados os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Celso Amorim (Defesa) e Aldo Rebelo (Esportes). Amorim declarou que a presidente já havia encomendado um programa de coordenação das entidades de segurança:

– Não só os ministérios da Justiça e da Defesa, mas também as autoridades estaduais, as polícias civil e militar, que farão o policiamento direto nas ruas. Não são absolutamente os militares (das Forças Armadas) que farão isso. Eles estarão ali para uma emergência, para proteger estruturas críticas, como as usinas hidrelétricas, como uma central nuclear.

A perspectiva é de que as manifestações só aumentem, à medida que se aproxima o 12 junho, data de início do Mundial. Para o Planalto, movimentos com reivindicações pendentes ou que tentam dar continuidade às manifestações populares do ano passado não vão desperdiçar a chance de ganhar visibilidade em um momento no qual os olhos do mundo – na forma de milhares de jornalistas estrangeiros – estarão pousados sobre o Brasil.

Um ministro de Dilma ouvido pela Agência Estado revelou que foi montado um gabinete de crise informal e permanente no governo federal. A presidente recebe informes reservados diários sobre as movimentações. Uma das estratégias do Planalto é desamarrar nós sociais, passíveis de gerar descontentamento.

Na semana passada, em visita a Porto Alegre, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, reconheceu que o tema virou prioridade no Planalto. Ele afirmou que o governo aposta no diálogo:

– Entendemos que em um país democrático é impossível haver um evento dessa magnitude sem que setores que tenham discordância ou que se contraponham ao evento não se manifestem. Vamos procurar abrir ao máximo o diálogo. Estamos já fazendo um processo de diagnóstico nas 12 cidades da Copa, no sentido de ver quais são as razões de descontentamento. Por exemplo, há problemas com remoções que não foram consideradas adequadas, há problemas de restrições excessiva em relação ao ir e vir das pessoas, à questão dos vendedores ambulantes.

Para o caso de o diálogo não ser suficiente e as forças policiais não conseguirem controlar a situação, o governo espera ter à mão uma estrutura à altura do desafio. A Força Nacional de Segurança Pública deverá ter de prontidão uma tropa formada por 10 mil homens. Há ainda possibilidade de utilização das Forças Armadas nas 12 cidades-sede. O plano é manter efetivos de reserva nos quartéis.

– As Forças Armadas têm seu papel no eixo defesa, e uma das atuações nesse eixo é a de ser uma força de contingência. O plano da segurança é fazer frente a qualquer ocorrência, e essa força de reserva é posta como possível – admitiu o coordenador da Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos, Humberto Freire.

Freire confirmou que, como parte da preparação para o Mundial, a secretaria gastou R$ 40 milhões na compra de armas de baixa letalidade, como balas de borracha e sprays de pimenta. Equipamentos de proteção individual para os policiais, como escudos, também estão sendo adquiridos.

Pontapé inicial e confronto em Natal

Na semana passada, Dilma Rousseff esteve em Natal (RN) para inaugurar a Arena das Dunas, um dos novos e contestados estádios construídos para a Copa do Mundo, e foi recebida com um protesto que degringolou em confronto com a polícia. Sem intimidade com a bola, a presidente deu o pontapé inicial simbólico no palco de quatro partidas da Copa.

Até ontem se especulava que Dilma pudesse estar em Porto Alegre na sexta-feira para solenidade de reinauguração do Beira-Rio, mas o ato está previsto para a próxima semana.

Mobilização anti-Copa nas redes sociais

Assim como em 2013, grupos contrários à Copa começaram o ano se articulando por meio das redes sociais. A hashtag #nãovaitercopa é uma das campanhas mais usadas para alertar sobre protestos previstos durante o Mundial. E as passeatas já se iniciaram. Em Porto Alegre, a primeira manifestação do Bloco de Luta pelo Transporte Público ocorreu na quinta-feira e, no sábado, um grupo se reuniu no Centro para reclamar contra a Copa. Na página do Facebook que organizava as ações do final de semana no restante do Brasil, os manifestantes criticaram a falta de “mudanças sociais e políticas” depois dos levantes em meio à Copa das Confederações, em junho – destacando que houve ato contra o Mundial em todas as cidades. “O Brasil precisa mudar, e não é no futebol. O clamor popular de janeiro em diante terá apenas uma voz: não vai ter Copa”, dizia o argumento do evento.

Militante do Coletivo Juntos, que integra o Bloco de Luta, Nathália Bittencurt, acredita que o mais correto seja utilizar a hashtag #vaiterluta:

– A Copa é uma pauta do Bloco de Luta, que tem muitas pautas. Dificilmente haverá uma separada em cada ato. Já estamos vivendo os efeitos da Copa há um tempo. Será um assunto trabalhado pré, durante e pós-Copa.

Pelo Facebook, os Black Blocs programam uma agenda com ações em diferentes pontos do país. Em Porto Alegre, o protesto seria em 15 de junho, no Beira-Rio.

Capital deverá ter reforço de PMs do Interior

O governo gaúcho está montando um plano para trazer policiais militares do Interior, caso a situação em Porto Alegre durante ou mesmo antes da Copa exija reforços. Em um cenário mais delicado, o secretário estadual da Segurança Pública, Airton Michels, admite solicitar um inédito apoio da Força Nacional de Segurança. Segundo Michels, a possibilidade de protestos antes e durante o Mundial virou a principal preocupação na área da segurança e entrou na pauta das reuniões preparatórias ao evento. Ele diz que a secretaria está preparada para deslocar 2 mil PMs do Interior, para se juntar aos 3 mil da Capital.

– Isso é muito possível. Temos condições de chegar aos 5 mil homens sem dificuldade, com rapidez. Se necessário, mobilizaremos até mais. Isso pode acontecer mesmo antes da Copa, se houver manifestações em maio.

O governo estadual avalia que não vai precisar recorrer ao auxílio da Força Nacional de Segurança Pública, mas deixa essa porta aberta. Já a necessidade de apoio das Forças Armadas é considerada pouco provável.

Como parte da estratégia para evitar problemas, a secretaria aposta em ações de inteligência, com identificação de pessoas que cometem crimes durante os protestos. A intenção é acompanhar esses manifestantes muito de perto, para bloquear sua ação.

– O Estado vai proteger as manifestações e agir como polícia quando houver crime. Antes da onda de protestos, trabalhávamos só com o evento Copa do Mundo. Agora, temos de nos preparar também para os protestos que podem ocorrer – avalia Michels.

A ESTRATÉGIA DO GOVERNO
FORÇAS DE PRONTIDÃO
Saiba quais são as ações previstas pelo Planalto para garantir a segurança no período da Copa do Mundo
Formada por policiais militares e civis voluntários, a Força Nacional de Segurança Pública deverá ter 10 mil homens à disposição durante a Copa, disponíveis para intervir caso as polícias locais precisem de apoio. As Forças Armadas também terão homens aquartelados. Serão cerca de 1,4 mil em cada cidade-sede. Eles só vão sair à rua em caso de solicitação direta da presidência ou dos governadores. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) manterá centros nos locais dos jogos. Ao todo, mais de 120 mil homens devem estar mobilizados nas cidades do Mundial.
ESTRATÉGIA UNIFICADA
Uma das preocupações do Planalto é que ações policiais mal executadas instiguem um clima de revolta nos meses anteriores à Copa. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, recebeu a missão de garantir a ascendência da Polícia Federal sobre as PMs. Além disso, ele vai se reunir com os secretários estaduais de Segurança para discutir estratégias padronizadas. Como parte desse esforço, o secretário-extraordinário de Segurança para Grandes Eventos, Andrei Rodrigues, começa hoje a levar orientações às forças policiais de cada cidade-sede. As primeiras são Natal e Fortaleza. Na capital gaúcha, o desembarque ocorre em 5 de fevereiro.
APOIO ÀS DELEGAÇÕES ESTRANGEIRAS
Depois da experiência vivida na Copa das Confederações, com batalhas campais nas cidades que sediaram jogos, as delegações estrangeiras ficaram assustadas com o que podem encontrar no Brasil neste ano. O governo federal pretende oferecer forças policiais para fazer a segurança das seleções e das autoridades estrangeiras não só durante as agendas oficiais, mas também nos momentos de lazer.
INTERVENÇÃO NOS ATOS VIOLENTOS
O governo está conformado com a ideia de que manifestações vão ocorrer. Mas não quer repetir erros da Copa das Confederações, quando houve confrontos enquanto a bola rolava. O princípio é permitir os protestos, esgotar as possibilidades de negociação e intervir apenas se houver vandalismo ou crime. O Ministério da Justiça já investiu R$ 40 milhões em armas de baixa letalidade para essa eventualidade.

 

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