ZERO HORA: De oito projetos previstos à segurança pública do RS, cinco estão parados

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17998349Com escassez de investimentos, especialistas avaliam ser praticamente impossível governo do Estado cumprir dois compromissos: meta de PMs e criar vagas para todos os presos

Ao completar um ano e três meses no Palácio Piratini, o governo José Ivo Sartori patina para cumprir compromissos voltados à segurança pública, firmados na campanha eleitoral. De oito promessas mensuráveis, identificadas no plano de governo, cinco ainda não foram cumpridas, duas evoluíram parcialmente e uma avançou.

Entre as que não prosperaram, duas, na avaliação de especialistas, dificilmente serão honradas até o fim do mandato de Sartori. Uma delas é a recomposição da “meta histórica de três policiais para cada mil gaúchos”. Na prática, isso significariacontratar 12 mil PMs, número expressivo para um Estado que mal consegue pagar os salários do funcionalismo em dia. Para isso, seriam necessários pelo menos R$ 574 milhões a mais por ano.

A outra promessa que levanta dúvidas é a de acabar com a falta de vagas nas prisões, “com a meta de criar 8 mil novas vagas”. Nenhum dos antecessores de Sartori conseguiu atingir números semelhantes. Lançado em julho de 2014, o plano de governo está registrado no Tribunal Superior Eleitoral. O tema da segurança é abordado a partir da página 30. Começa com uma constatação que se mantém atual: “Os gaúchos estão inseguros. Muito e gravemente inseguros.”

Em seguida, traça diagnóstico da situação e elenca propostas. Nem todas apareceram nas propagandas eleitorais de Sartori, avesso a fazer promessas. Em um dos programas, o atual governador limitou-se a mencionar a intenção de “aumentar o efetivo da BM, que está defasado”.

Para o especialista em segurança pública Eduardo Pazinato, Sartori terá dificuldades para realizar não apenas esse propósito como também os demais – entre eles investir em tecnologia e ampliar o quadro de delegados e investigadores.

— Ou a situação das finanças foi subestimada ou Sartori não tinha a real dimensão dos problemas na área da segurança. O plano é demasiadamente vago e, quando estabelece metas numéricas, é pouco factível — diz Pazinato, coordenador do Núcleo de Segurança Cidadã da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma).

O secretário estadual da Segurança Pública, Wantuir Jacini, reconhece as limitações, mas argumenta que faz o possível. Ele evita criticar o plano. Diz que, ao assumir o cargo, leu o material e, a partir dele, elaborou novas metas, reunindo iniciativas que pudessem ser concretizadas sem precisar grandes aportes financeiros – como a nova lei dos desmanches e operações para coibir ferros-velhos ilegais, que, desde o início do ano, recolheram mais de cem toneladas de peças irregulares.

— Em razão das dificuldades do Estado, esse plano não pode ser implementado na sua inteireza. Estou trabalhando com recursos existentes. Assim que a situação melhorar, tenho tudo pronto para executar compromissos — diz Jacini.

Uma das propostas do plano que avançou – e não exigiu verbas extras – foi a intensificar patrulhamento em bairros violentos, com o Programa Avante. A iniciativa mapeou e passou a priorizar as regiões conflagradas de Porto Alegre, Região Metropolitana, Vale do Sinos e Caxias do Sul, a partir da análise de indicadores criminais.

— A intenção é ampliar o alcance a todos os 16 comandos regionais — afirma o subcomandante-geral da BM, coronel Andreis Dal’Lago.

Contratar 12 mil PMs amplia rombo nas contas em 10%

Para contratar 12 mil PMs e, assim, atingir a marca de três policiais a cada mil habitantes, o governo José Ivo Sartori teria de desembolsar, pelo menos, R$ 44,16 milhões por mês. A medida aumentaria o rombo mensal do Estado – que já passa de
R$ 450 milhões – em 10%. Por ano, a consequência seria o acréscimo de R$ 574 milhões nos gastos com pessoal, cujo limite máximo admitido pela lei de responsabilidade fiscal (49% da arrecadação) já foi extrapolado – em dezembro passado, atingiu 49,18% da receita corrente líquida.

A projeção é calculada com base na remuneração inicial de um PM, que, segundo dados da Secretaria Estadual da Fazenda, é de R$ 2.828. Levando em conta os custos com encargos sociais, o valor-base salta para R$ 3.680. Na avaliação do professor de economia da UFRGS Fernando Ferrari, dificilmente Sartori conseguirá atingir a meta, por conta da crise das finanças estaduais e da desaceleração da economia. Vale lembrar que a projeção de déficit para 2016 é de R$ 6,8 bilhões.

— Se não houver aumento de receita decorrente da recuperação da economia, contingenciamento e racionalização de gastos por parte do Estado e êxito no processo de renegociação da dívida com a União, é muito pouco provável que a promessa seja cumprida na sua totalidade — estima Ferrari.

Mesmo que o Piratini obtenha recursos suficientes para tanto, o descumprimento da lei fiscal impõe uma série de restrições. Se o Executivo não se readequar em oito meses, corre o risco, por exemplo, de ter repasses federais suspensos. E o problema é que as despesas com o funcionalismo tendem a crescer nos próximos meses, mesmo sem nomeações. Motivo: os reajustes concedidos a servidores da segurança no governo de Tarso Genro (PT) foram parcelados até 2018 e, só em 2016, representarão R$ 900 milhões a mais na contabilidade do Estado.

Além disso, chamar 12 mil PMs exigiria fazer um novo concurso (atualmente, existem 1,9 mil PMs concursados sem ser chamados), o que requer tempo. Depois, todos teriam curso de formação.

— Já se passou mais de um ano de governo, acredito que não haveria tempo hábil para reequilibrar finanças — pondera Pazinato.

COMO ESTÃO OS COMPROMISSOS PARA A SEGURANÇA PÚBLICA

ZH avaliou oito compromissos que constam no plano de governo, de julho de 2014, e nas diretrizes do documento, de setembro de 2014:

1 – MAIS PMs
“Dar continuidade à reposição do efetivo da BM, de modo a recompor, pelo menos, a meta histórica de 3 policiais para cada mil gaúchos”. Na prática, significa contratar no mínimo 12 mil PMs.

Como está


Sartori autorizou a nomeação de 178 PMs concursados para substituir contratos temporários vencidos, mas não houve aumento do efetivo. Segundo o governo, “todos os esforços estão sendo feitos” para isso. Sem novos quadros, o efetivo tem diminuído.

2 – TECNOLOGIA PARA AÇÕES PREVENTIVAS
Fazer “investimentos em sistemas de comunicação e georreferenciamento” para aprimorar a capacidade de planejamento e de execução de ações preventivas da BM.

Como está


Os investimentos não saíram do papel, embora a Secretaria da Segurança informe que está em andamento projeto para instalar 16 torres de radiocomunicação na região da fronteira, com aporte de R$ 6,5 milhões, oriundo de convênio com a União.

3 – MAIS DELEGADOS E INVESTIGADORES
Promover a “ampliação do quadro de delegados e investigadores” e “avaliar e propor a criação de novas delegacias especializadas, principalmente, de homicídios”.

Como está


O quadro não foi ampliado. Conforme a Secretaria da Segurança, “todos os esforços estão sendo feitos” para isso, mas “é necessário que seja observado o cenário das finanças”. O mesmo vale para as delegacias, além de uma especializada em apurar homicídios, que foi aberta em Santa Maria.

4 – CANAL PARA ACOMPANHAMENTO DE INQUÉRITOS
“Criar mecanismo ágil e fácil, via internet ou 0800, que permita ao cidadão acompanhar o andamento dos inquéritos” para melhorar o atendimento aos cidadãos nas DPs.

Como está


Conforme a Secretaria da Segurança, “ainda não foi possível dar andamento à iniciativa, mas está no planejamento da Polícia Civil”.

5 – ZERAR O DÉFICIT DE VAGAS NAS PRISÕES
No plano de governo, consta o objetivo de “zerar o déficit de vagas prisionais”, com a “meta de criar 8 mil novas vagas”, compromisso que aparece de forma menos específica nas diretrizes.

Como está


O déficit está longe de ser zerado, embora o governo tenha acabado de inaugurar omódulo 1 da penitenciária de Canoas (393 vagas). Outras 4,6 mil vagas estão previstas até o fim da gestão atual.

6 – NOVAS VAGAS PARA TRATAMENTO DE DROGADIÇÃO
Promover a “abertura de mais vagas nas redes publica e filantrópica de saúde” (a) e a “ampliação da rede de comunidades terapêuticas” (b) a fim de fortalecer o tratamento da dogadição.

Como está


a) Não foram abertas vagas novas. Segundo a Secretaria da Saúde, foram apenas mantidos 1,7 mil leitos de saúde mental em hospitais gerais e especializados
em psiquiatria.


b) A rede de comunidades terapêuticas segue a mesma, mas os leitos cadastrados subiram de 225 para 554.

7 – PATRULHAMENTO EM BAIRROS VIOLENTOS
“Desenvolver programas permanentes de patrulhamento nos bairros mais violentos das médias e grandes cidades.”

Como está

Com o Programa Avante, a BM intensificou o patrulhamento em regiões violentas do Estado. Segundo o governo, a iniciativa é permanente. Operações ligadas ao programa resultaram em mais de 130 prisões este ano.

8 – RECUPERAÇÃO DE JOVENS INFRATORES
Promover a “descentralização radical” da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase) (a) e a “ampliação dos programas de ressocialização com bolsa em dinheiro específica para as famílias” (b).

Como está

a) Em 2015, foram firmados convênios com Osório, Santa Cruz do Sul e Viamão para construção de três Centros de Atendimento Socioeducativo. Os municípios cederam terrenos, e o dinheiro virá do BID.



b) Os programas de ressocialização com bolsa se mantêm os mesmos desde a última gestão.

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