Decisões judiciais proíbem policiais de se aproximarem de suspeitos que prenderam

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Fonte: ADRIANA IRION / GZH

Como espécie de medida protetiva em favor de suspeitos de crimes, juízes têm proibido policiais militares de se aproximarem de pessoas que tenham prendido. As decisões são emitidas em audiências de custódia, depois de defensores alegarem suposta irregularidade nas prisões efetuadas por PMs.

A Brigada Militar (BM) chegou a ter, recentemente, 11 policiais alvos deste tipo de proibição, decorrente de medidas assinadas por juízes.

Em um dos casos — que se refere a uma captura por porte ou posse ilegal de arma de fogo de uso restrito, feita por integrantes do 20º BPM, de Porto Alegre —, o Ministério Público (MP) ingressou com habeas corpus contra a decisão do magistrado. Liminarmente, o Tribunal de Justiça (TJ) suspendeu a decisão do juiz de 1º grau, mas o caso ainda depende de julgamento de mérito.

As situações estão causando mal-estar nos quartéis, já que o trabalho dos PMs é iminentemente na rua, abordando suspeitos. O promotor Gustavo Ronchetti, autor do hábeas, rebate esse tipo de medida judicial com o argumento de que, muitas vezes, apontar abusos ou ilegalidades nas prisões em flagrante são apenas estratégias de defesa:

— A atividade policial não pode ser cerceada. A medida foi abusiva e sem base em dados concretos de que houve algum problema na prisão em discussão. Sem um dado concreto de que ocorreu violência ou ilegalidade, o juiz não pode mandar iniciar uma investigação contra os policiais nem determinar restrições desse tipo, que muito se assemelham ao que se tem em casos envolvendo a Lei Maria da Penha. Não é porque há casos de abusos que se vai desconfiar do policial sempre só por ser policial.

Nesse caso específico, o suspeito foi visto portando arma em um local onde havia ocorrido um tiroteio que resultou em três mortes. Segundo os policiais, o homem tentou fugir pulando por muros e telhados e teria caído de uma altura de dois andares. Na abordagem, teria reagido. Foi levado para atendimento médico e depois, para confecção de prisão em flagrante na Polícia Civil.

No dia da audiência de custódia, ele não compareceu por não ter sido levado pela Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). Na ocasião, a defensora pública sustentou haver indícios de “grave violência policial na abordagem” e pediu providências. O juiz homologou a prisão em flagrante, concedeu liberdade provisória ao suspeito e, em relação à alegação da defensora, determinou nos itens 3 e 4 da decisão:

“3 — Diante dos indícios de irregularidade nos atos referentes à realização da prisão, pela expedição de ofício, solicitando a apuração e adoção das providências cabíveis, com posterior informação ao juízo das medidas efetivamente adotadas, ao/à:

I — Corregedoria da Polícia Civil;
II — Promotoria do Controle Externo da Atividade Policial;

4 — Pela adoção das seguintes providências adicionais: Oficie-se à Polícia Civil para identificação dos Policiais que realizaram a prisão em flagrante e notifique-os para que não entrem em contato ou se aproximem, inclusive por interposta pessoa, do flagrado e sua família.”

A medida atingiu diretamente quatro policiais militares do 20º BPM. Quando teve conhecimento do teor da decisão, o promotor se surpreendeu.

— Nós tentamos primeiro clarear a decisão, entender qual era o alcance. Se, por exemplo, ao ver o suspeito armado ou cometendo crime, esses policiais não poderiam agir. Mas os embargos de declaração não foram acatados. Então, ingressei com hábeas. Os policiais atuam nas ruas, fazendo abordagem e, justamente, se aproximando de suspeitos. Essa foi uma medida açodada — disse o promotor Ronchetti, que atua na 2ª Vara Criminal do Fórum Regional do Partenon.

Na decisão em que acatou o habeas corpus, o desembargador relator registrou:

“… quando da abordagem policial, o paciente caiu em meio a fuga de um imóvel de 02 metros do chão. Encaminhado a atendimento médico, restou atestado em seu prontuário a existência de lesões superficiais em virtude da queda por ele relatada quando do atendimento. Não há registro de queixas em virtude de agressão policial. Outrossim, quando da realização da audiência de custódia, o réu não compareceu. Ora, ao que tudo indica, a Defensora Pública não teve contato com o flagrado de modo a verificar tal agressão, e tampouco há documentos suficientes a isso comprovar. O fato de os policiais terem feito uso de força moderada na ocasião da abordagem do flagrado por ele ter resistido à prisão não conduz a conclusão, por si só, de que de tal proceder acarretou lesões — o que inclusive não foi identificado em atendimento médico. Considerando que o elementos colhidos indicam que, provavelmente, o flagrado não sofreu agressão policial, entendo que se mostraram injustificadas as determinações dadas pelo Juízo”.

Por enquanto, outras medidas, com proibições semelhantes, ainda seguem em vigor. Procurado por GZH, o comando da Brigada Militar não quis falar sobre o assunto.

Já a direção de comunicação do TJ informou que “a finalidade das audiências de custódia é justamente avaliar as circunstâncias em que houve a prisão e se estão sendo preservadas a regularidade do ato e as garantias dos detentos”.

“Quando eventualmente for constatado algum indício de irregularidade durante a prisão, são tomadas as providências cabíveis, seja para apuração dos fatos verificados, seja, excepcionalmente, para a concessão de medidas cautelares pertinentes à proteção do detento. Com mais de 3.000 audiências já realizadas, o novo serviço prestado pelo Nugesp (Núcleo de Gestão Estratégica do Sistema Prisional) revela-se fundamental à garantia de direitos relacionados ao encarceramento preventivo, sendo isso viabilizado em razão da união de esforços entre os Poderes Judiciário e Executivo, Ministério Público, Defensoria Pública, OAB e forças estaduais de segurança”.