Brigada punirá protesto de PMs

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Cúpula da Segurança avaliou manifestação de policiais que interromperam BR-386 para pressionar por melhores salários 

Em uma reunião que se estendeu ao longo da tarde em Porto Alegre, a cúpula da segurança pública decidiu que irá punir o policial militar que tenha tido envolvimento com o protesto realizado pela manhã em Frederico Westphalen que fechou por mais de uma hora a estrada Carazinho-Iraí (BR-386), no norte do Estado. A manifestação foi mais um movimento de pressão pela implantação da PEC 300, que prevê a equiparação salarial entre policiais militares e civis e bombeiros aos do Distrito Federal.

Pneus incendiados foram postos na rodovia, impedindo o trânsito.

– Nós não apoiamos e punimos esse tipo de procedimento, que é proibido pela lei que regulamenta a atividade policial – disse o comandante-geral da Brigada Militar, coronel Sérgio Roberto de Abreu, indicado pelo secretário da Segurança Pública, Airton Michels, para falar sobre o episódio.

O ato será investigado pela Polícia Civil. No final da tarde de ontem, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) registrou o caso na Delegacia da Polícia Civil de Frederico Westphalen. A ocorrência deverá se transformar em inquérito policial para apurar a autoria do incêndio.

Apesar de a presença de PMs no protesto ter sido confirmada, Abreu disse que, nos informes que recebia sobre a manifestação, não constava a presença de integrantes da corporação. Para agir, o comando da BM espera a comprovação oficial do envolvimento dos policias, o que deverá ser determinado pelo inquérito da Polícia Civil.

– Se no decorrer do inquérito policial ficar comprovada a participação de brigadianos, nós deveremos agir. Há um fato que tem ficar às claras para a sociedade: não podemos agir sem respeitar o ritual jurídico da apuração policial – disse o coronel.

Caso a investigação da Civil aponte PMs envolvidos no protesto, eles deverão responder a um inquérito administrativo na BM, que prevê diversos tipos de punição, como a detenção.

É de conhecimento das autoridades gaúchas que o protesto é nacional. E que embora os líderes não tenham visibilidade pública, eles estão agindo e apostando alto na mobilização que deverá acontecer na próxima semana, em Brasília, para pressionar pela aprovação da PEC 300.

Conforme o comandante da BM, a PEC 300 é uma reinvindicação dos policiais que vem sendo negociada em todos os Estados. Para Abreu, a negociação se deve ao fato de que sua implantação deverá trazer um imenso impacto nas finanças das corporações.

– É um assunto complexo. Mas estamos negociado pelos canais competentes – afirma o comandante-geral da BM.

CARLOS WAGNER E EDER CALEGARI

A PEC 300
– A Proposta de Emenda à Constituição de nº 300, a PEC 300, propõe que os salários dos policiais militares, bombeiros e policiais civis de todo o país sejam equiparados aos dos do Distrito Federal, os mais bem pagos do Brasil. Segundo a Secretaria a Fazenda, o piso salarial de um soldado da BM, que é de R$ 1,2 mil, passaria para R$ 3,5 mil, . Por se tratar de uma mudança da Constituição de 1988, a PEC 300 precisa ser aprovada em dois turnos na Câmara Federal. No ano passado, ela foi aprovada no primeiro turno. Atualmente, está em uma comissão especial da Câmara onde estão sendo feitos ajustes, reivindicados pelos deputados. Poderá ir votação no próximo mês.

Trânsito na região foi afetado 

O grupo de policiais militares que organizou o bloqueio da rodovia Carazinho-Iraí (BR-386) em Frederico Westphalen, no norte do Estado, não tem vinculação com sindicatos da categoria. No início da manhã de ontem, o grupo ateou fogo em pneus que estavam sobre a rodovia, na altura do km 20, interrompendo o trânsito por mais de uma hora.

No local não haviam manifestantes. Faixas que foram fixadas junto ao acostamento da rodovia pediam aumento de salário e a aprovação da PEC 300 (veja detalhes em box acima). A estrada liga Frederico Westphalen até Iraí, sendo a principal via de ligação da região com o Estado de Santa Catarina. Houve congestionamento nos dois sentidos da pista.

Vinculados ao 37º Batalhão da Polícia Militar de Frederico Westphalen, os policiais, que não querem se identificar por temor de represálias da corporação e pelo ato se caracterizar por insurgência, teriam contato via blogs e redes sociais com outros grupos do país que também pedem a aprovação da PEC 300.


Mensagem irônica

Outra manifestação já havia sido feita em 22 de junho na BR-386. Na ocasião, a Associação Beneficente Antonio Mendes Filho (Abamf), que representa servidores de nível médio da Brigada Militar do RS, assumiu ter instalado sobre a sinalização de trânsito uma faixa com os dizeres: “Bem-vindos ao Rio Grande do Sul. Aqui os policiais militares recebem o pior salário do Brasil.”

ENTREVISTA

“Não temos medo de punição”

Fernando Almança, policial militar

O policial militar Fernando Almança, de Cachoeiro do Itapemirim (ES), tornou-se referência nacional na luta pela aprovação da PEC 300. Almança usa como instrumento de mobilização comunidades virtuais, sendo a principal o site o www.pec300.com. Ontem, ele falou com Zero Hora:

Zero Hora – Um grupo de policiais da Brigada Militar trancou a BR-386 para pressionar a favor da aprovação da PEC 300. O que aconteceu aqui é parte dessa mobilização nacional?

Fernando Almança – Justamente. O Rio Grande do Sul foi um dos últimos Estados a entrarem na mobilização, apesar de ser um dos piores salários do Brasil. Não tenho conhecimento dos detalhes do que aconteceu aí.

ZH – Vocês estão mobilizados em quantos Estados?

Almança – Agora estamos, praticamente, em todo o país.

ZH – Vocês têm alguma vinculação com partido político?

Almança – Não. Somos apartidários. Apenas lutamos pela aprovação da PEC 300.

ZH – Qual a chance de vocês conseguirem aprovar a PEC 300?

Almança – São boas. Inclusive porque ela já foi aprovada em primeiro turno. Acreditamos que nossas mobilizações vão pressionar os congressistas. Na semana que vem vamos fazer uma manifestação em Brasília.

ZH – O tipo de manifestação que aconteceu no Rio Grande do Sul, com queima de pneus e trancamento de estrada, é a estratégia para lidar com os políticos?

Almança – Claro que não recomendamos esse tipo de manifestação. Mas também não orientamos o governo gaúcho a pagar um dos piores salários do país para os seus policiais militares e bombeiros.

ZH – Os policiais militares e os bombeiros estão submetidos ao Código Militar, que não permite greve ou qualquer outra manifestação. Vocês temem ser punidos?

Almança – Estamos chegando a um ponto em que não temos mais medo de punição, tal é a nossa necessidade salarial.

ZERO HORA